Tendência ao vício

Nessa nova série, eu conto histórias de amigas minhas, porque histórias merecem ser contadas.

Hoje voltamos ao ano de 2004, quando minha amiga Fá descobriu o bingo.

A Fá é de uma cidade do interior de Minas Gerais chamada Timóteo mas, como muitos jovens da região, mudou-se para Belo Horizonte para fazer faculdade, e foi aí que tudo aconteceu.

Cansada da vida de baladas universitárias, uma amiga da Fá a convidou para ir a um bingo. Sim, aqueles bingos com pessoas mais velhas, cartelas de papel, que alguém gira um globo e sorteia bolinhas. Os prêmios vão desde valor em dinheiro a eletrodomésticos e animais.

O convite foi prontamente aceito e as duas foram ao local. Pode ter sido sorte de principiante, mas nesse dia a Fá ganhou 6 mil reais. Se hoje isso é muito dinheiro, imagina em 2004. E quando você ganha uma grana dessas de um jeito fácil, não existe outra opção, você precisa voltar lá, e foi o que ela fez.

E continuou voltando muitas vezes, nunca mais ganhou esse dinheirão, mas ganhou pequenos prêmios e, como em todos os jogos de azar, também perdeu bastante. Percebendo que o bingo estava se tornando um vício e, como a Fá mesmo diz, ela tem tendência ao vício, decidiu criar um mecanismo para que não perdesse todas suas economias, começou a limitar a quantidade de dinheiro que iria apostar.

Tudo isso acontecia sem o conhecimento de seus pais que, morando em uma pequena cidade do interior de Minas Gerais, nunca entenderiam como a filha estava ganhando tanto dinheiro na capital.

As idas ao bingo seguiram, às vezes com mais frequência, às vezes com menos. A amiga que a havia levado lá da primeira vez já tinha desistido há algum tempo, e Fá agora havia criado vínculos com os senhores e senhoras que frequentavam o mesmo bingo que ela.

A informação que todo mundo já sabe, mas que eu ainda não mencionei, é a de que bingos tornaram-se ilegais em 2004, mas por todo o país os jogos continuavam. Perto da minha casa mesmo, ao lado do Shopping Ibirapuera (para quem é de São Paulo), funcionou um bingo enorme, por muitos anos depois da proibição. Independente disso, bingos eram ilegais.

Eis que um dia, Fá e seus colegas idosos estavam curtindo mais um noite de bingo, já no ano de 2008, quando de repente a polícia invadiu o local. Invadiu mesmo, cena de filme. Entraram vários policiais armados, começaram a cercar o local, mandando todo mundo por as mãos para cima e deitar no chão.

Fá entrou em desespero. Não preocupada com a sua segurança, isso era o de menos, mas achou que daquele dia não passaria, seus pais iriam descobrir tudo sobre o seu vício.

Imaginando a cara de seu pai e o desespero de sua mãe, ela não teve dúvidas, enrolou todas suas cartelas até que virassem pequenas bolinhas e as engoliu. Engoliu mais de 20 cartelas de bingo de uma vez.

Sua tática funcionou, ela não foi presa e seus pais não descobriram nada, também não descobriram porque ela passou a semana inteira vomitando, mas foi um preço barato a se pagar.

Fá agora está recuperada e tenta manter-se longe de jogos de azar.

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